quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Minha Experiência na Amazônia

Viagem pelo rio Madeira
A primeira vez que fui a Porto Velho foi inesquecível. Não era uma viagem qualquer, era a primeira vez que eu ia à cidade e, também, a primeira vez participando de um festival de cinema, o Cine Amazônia.

Tudo me encatava: o entusiasmo dos colegas, a euforia dos organizadores, a chegada dos convidados, a programação. A única coisa que me incomodava era o calor excessivo e o estado precário da cidade – como o mau cheiro e a sujeira em ruas e calçadas. Ainda assim, perto do que eu sentia, eram apenas detalhes.

A abertura do Cine Amazônia não ocorreu conforme o previsto, por faltar energia. Mas, nem isso abateu meu entusiasmo. Voltei para o hotel e fui beber um pouco de vinho com a colega Giliane, para aliviar o cansaço.

No dia seguinte, à tarde, foi realizada a amostra oficial dos filmes concorrentes e participantes. Foi “a abertura”, esdrúxula perto do que estava planejado na noite passada, mas foi. Não deixou de ser emocionante. Principalmente com as palavras do cineasta Geraldo Sarno, elucidando a importância do cinema na sociedade como transmissor dos papéis sociais.

As amostras de filmes continuaram nos dias seguintes. Os lugares de exibição eram os mais diversos: no circo, no terreiro, às margens do rio Madeira. Aliás, aí que realmente começa a história: às margens do rio Madeira. Todas as outras mostras foram excepcionais, mas ver filme junto à comunidade São Sebastião, à beira do rio, foi uma experiência inigualável. Aquela noite estrelada de quinta-feira ficou ainda mais bela com o reflexo das luzes do porto no rio, o som aconchegante das águas e a visão curiosa de um primeiro passeio de balsa até chegar ao destino de São Sebastião.

Todas as pessoas a bordo demonstravam um ar diferente. As pessoas, as câmeras, livros e revistas de mãos em mãos, formavam uma espécie de “mundo de cinco minutos” – o tempo da viagem pelo rio.

Ao chegar à comunidade São Sebastião, me deparei com um boteco à beira-rio (que como qualquer outro boteco vendia coisas simples como pinga Oncinha, cerveja Crystal, salgadinhos do tipo “esquini”, mortadela, tocava Reginaldo Rossi e Trio Parada Dura), duas ou três casas de madeira ao fundo, uma paróquia da Igreja Católica, também de madeira, e um barracão onde ocorreria o festival. No barracão, havia cerca de 120 pessoas, entre moradores e visitantes.
Entrei para assistir o início, mas logo saí, pois estava muito quente. Fui para o simpático boteco comer, beber uma cerveja e fumar um cigarro. Havia cerca de dez pessoas conversando, bebendo, olhando o rio. E dentre essas pessoas uma se destacava: Paulão.

Guia-lavrador-pescador
Paulão era um sujeito simples: aparentava ter 36 anos, moreno, baixo, e estava “pra-lá-de-Bagdá”. E penso que sua embriaguês contribuiu para o momento.
Minha conversa com Paulão começou quando pedi uma cerveja. Ele manifestou-se na hora: “e aí parceiro, você é do Rio, do Rio de Janeiro?” perguntou, incessantemente. Logo eu disse que não, que era do interior de Rondônia. Vi que a conversa ia render frutos e pedi outro copo. “Vamos tomar uma?”, perguntei ao Paulão. Ele nem pensou duas vezes para responder e aceitou o convite. A partir daí começamos uma conversa “histórica”.

A primeira coisa que perguntei a Paulão foi seu nome e, depois, de onde ele era. Diante dessas duas perguntas ele desenhou os caminhos de sua vida. Começou falando que era uma espécie de guia ambiental – expressão, aliás, que repetiu várias vezes – e que conhecia muitas pessoas da Petrobrás, alguns pesquisadores americanos e outras pessoas “importantes”.

Paulão disse que o fluxo de estrangeiros na região era demasiado. Falava muito de estadunidenses que visitavam o local para pesquisa e turismo. De repente, mudei a rota do assunto, perguntei-lhe sobre as doenças (como malária e dengue). Ele falou que esse tipo de coisa era rotina na comunidade, que já não assustava os moradores. Ah, já ia me esquecendo, meu colega Neto, nesse momento, também estava conosco. Ele perguntou sobre os primeiros socorros em caso de mordida de cobra – freqüente na região. Paulão disse que o que acontecia ali, resolvia ali mesmo. Alegou também que de vez em quando iam enfermeiras ou médicos visitá-los. Mas, apenas lembrando, iam “de vez em quando”.

Ele falou bastante de suas viagens e de sua família. Mas o que ele não escondia era sua profissão de sangue: pescador. O que Paulão falava, de fato com entusiasmo, era de sua vida de pescador. O orgulho transbordava nas palavras do ribeirinho. Ribeirinho, guia ambiental e pescador, transformava-se também em lavrador em tempos de seca. Aí, durante esses meses de plantação no interior, a saudade da família e do Madeira apertava, reclamou. Seu destino era incerto e seu humor era bom e embriagado.

Sandro Melo Vieira - estudante do 4º período de Jornalismo e bolsista do CCDA

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